sábado, 30 de outubro de 2010

Dois trios, três duplas - Revezamento Bertioga-Maresias

Pelo quarto ano consecutivo faço essa prova. No primeiro ano participei apenas como torcida, já que estava de patinha quebrada. mesmo assim, me senti parte da equipe.
Neste último sábado, porém, em vez de irmos em sexteto como nas edições anteriores, montamos dois trios: um feminino o outro masculino. Foi muito divertido.

Nosso esquema para a prova, made by Roi
 Uma parte da graça dessa prova é organizar a logística: carros de apoio, quem leva quem aonde e que horas. Tínhamos uma boa equação: dois trios de corredores (Julinha, Mari e eu/ Roi, meu marido + David e Zé), um carro de apoio com motorista (Tamara, esposa do Zé), um carro sem motorista, nove trechos a serem percorridos.
O Roi pode não ser bom em encontrar as coisas mas é perito em montar planilhas, esquematizar informações e colocar no papel. Portanto, mais uma vez, a logística da prova ficou por sua conta.
Viajamos na sexta à noite, no Doblo: David, Mari, Julinha, Roi e eu. Paramos num posto e comemos uns sanduíches de pão borrachento com queijo gosduroso e mal derretido. Ninguém nem ligou. Lembrei de tantas vezes que desci pro litoral e parei neste mesmo posto, louca pra chegar na praia, tomar cerveja, umas vodcas, ficar na farra até altas da madrugada e acordar tarde e com dor de cabeça no dia seguinte. A parte boa era conviver com os amigos, dar risadas, falar besteira. Então alguns anos depois, estou indo novamente pra praia com amigos e marido, rindo e falando besteira. Só que sem a ressaca do dia seguinte. provas de corrida podem sem uma coisa ótima!
Chegamos à nossa Pousada, simples mas limpa e ao lado do PC1 - largada do segundo trecho. Ficamos num "chalé triplex" que não era um chalé nem aqui nem na China e sim um apartamentinho de dois andares, com várias camas, cozinha e dois banheiros.
Aprontamos as coisas pro dia seguinte - principalmente eu, que seria a primeira a correr - e nos jogamos nas camas.
A noite não foi das melhores. Gente batendo papo, crianças gritando, barulhos em geral. Mas, se o desempenho das provas dependesse das noites da véspera, eu teria sempre um péssimo resultado. É raro dormir bem.
Na manhã seguinte, Mari acordou queixando de dor de garganta. Tossiu a noite inteira. Sorte que a Julinha dorme como uma pedra, nem escutou.
Tamara e Zé passaram pra me pegar. Nós dois faríamos uma dupla, pois correríamos os mesmos trechos: 1, 4 e 7.  Chegamos a cinco minutos da largada. Não deu nem pra alongar. E, confesso, não deu também aquela emoção que costumava me dar antes do início de uma competição. Seria um longo dia e eu estava tranquila.
Fomos juntos, num ritmo mais lento do que a maioria dos corredores mas, pouco a pouco, fomos apertando o passo. Falei pro Zé que ele poderia ir, sem se preocupar comigo. Ele foi, mas logo emparelhei. A areia dura, o tempo fechado, o espaço aberto e a musiquinha no Ipod nos empolgaram e chegamos ao final do trecho 1 bem acelerados. Lá, nos esperava a segunda dupla: Mari e David, além da Tamara que nos levou até nosso próxima largada.
Fiquei muito contente com meu desempenho. Tenho treinado corrida bem mais ou menos portanto, estava temerosa. Os joelhos estavam ótimos, mas fiz um gelinho assim mesmo.
Nem deu muito tempo de descansar, já era hora do nosso segundo trecho, que saia de Guaratuba e também vai pela praia quase todo o tempo. Como o Roi chegou um pouco antes, Zé largou na frente e passei metade da corrida tentando alcançá-lo. Enquanto esperávamos nossa saída ele veio com aquela conversa de que não aguentaria manter o mesmo ritmo tal e coisa. Ba-le-la. Saiu queimando o chão e eu me esbafori pra chegar nele. Resultado, no final o joelho começou a pegar. Não o que estava doendo ultimamente. O outro. O esquerdo, que  foi o primeiro a começar a doer logo depois do Iron, então passou pro direito.  Caprichei nos cuidados com o direito. O esquerdo ficou invejoso e resolveu doer no final da nossa segunda perna.
Zé terminou um pouquinho na minha frente mas, não adiantou nada. A Mari tinha pifado e, para não perdermos a viagem, o David esperou eu chegar para levar nosso chip até o o trecho em que a Julinha assumiria.
Tomei um advil, fiz gelo e rezei. O trecho 7,  Juréia - Juqueí, era o meu último, porém o mais difícil. Mais uma vez, nossa espera foi curta. Julinha e Roi vieram voando.
Zé também estava cansado e foi mais devagar. Logo de saída vi que meu joelho não iria dar trégua. O piso, pra complicar ainda mais a situação, é muito irregular: estrada de terra toda esburacada, pedregulhos, serrinha, areia dura e, no finzinho, areia fofa pra acabar com a gente de vez.
Quase desisti. Mas, quando se está em equipe, a responsabilidade é maior. Depois, esse negócio no joelho é só chato e doloroso, mas não é grave. Correr com o joelho assim não vai arrebentar meu tendão, quebrar minha patela ou me aleijar de qualquer modo. Respirei fundo, tente me distanciar da dor e, no final, consegui até apertar um pouco mais o passo. Sobrevivi, terminei com o joelho inchado mas, como diz o ditado, ajoelhou, tem de rezar ou, no caso - correr.
David levou os dois chips novamente. Entregou para Roi e Julinha e, até sair o resultado da prova não sabíamos se ele tinha entregado o chip certo.
Os dois fizeram o trecho final. Fui no carro com o Zé e Tamara, enfiada no teto solar, mexendo com os corredores. Festeja e aplaudia os "solo" e as pessoas que conhecia.  Às vezes os corredores que estavam próximos ficam esperando que eu dissesse alguma coisa, mas eu brincava "ah, não, você não é solo, tá fazendo só este trechinho, não merece aplauso".  Avistamos a Julinha descendo a ladeira sem freio algum e, até estacionar o carro, Roi e ela já tinham chegado. Uma pena. É muito legal todo mundo estar junto na reta final.
Nem esperamos o resultado. Afinal, sabíamos que não seria justo levarmos troféu e subirmos no pódio, já que nossa equipe teve de fazer uma gambiarra pra não sair da prova. Outra pena. Ficamos em terceiro no trio feminino e, tenho certeza, de que teríamos ficado em terceiro se a Mari tivesse corrido porque além de ela ter acompanhado bem o David em seu primeiro trecho, ficamos uns 30 minutos na frente das quartas colocadas.  Acontece.
Mari e David conseguiram carona pra São Paulo e subiram assim que terminamos. Nós cinco fomos almoçar num delicioso restaurante italiano lá em Maresias. Tomamos vinho, comemos bem e falamos de tudo um pouco. E começamos a planejar o próximo ano.
Mais uma vez, foi ótimo. Nada como uma corrida pra gente se divertir com os amigos.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Na minha companhia

Nos últimos tempos tenho fugido do assunto "treinos". Não só porque estava meio café-com-leite mas também porque outros assuntos me pareceram mais interessantes e relevantes. Mas hoje volto às origens.
Terminei as sessões de fisio, voltei a nadar,  mas o ombro ainda está se recuperando. A cirurgia foi apenas há dois meses. Meus joelhos estão sub judice desde o Iron. Não posso abusar. Isso tudo diminuiu meu rendimento cárdio - respiratório. Ganhei um pouquinho de peso.
Tenho treinado bastante na minha própria companhia. Não porque não goste de parcerias - muito pelo contrário - mas porque estou num momento de readaptação em que preciso, mais do que nunca, prestar atenção nos sinais que o corpo me dá e  adequar meu ritmo a essas informações. Perto dos outros, conversando, tentando acompanhar, me distancio de mim mesma.
No domingo de feriado, fui para Romeiros. Fazia muito, mas muito tempo mesmo que eu não ia. Minha primeira e única tentativa de ir este ano foi frustrada. No pedágio o carro pifou e acabei indo pra USP.
Além do meu marido, estavam mais três colegas de MPR fortes e animados - Daniel, Marquinhos e Flávio. Sai do carro, me arrumei e dei adeus. Sabia que eles me alcançariam, passariam e deixariam bem pra trás, portanto, quanto antes eu saísse, menos eles teriam de me esperar na volta. Eles ofereceram companhia, acharam que eu estava antissocial, mas não era nada disso. Simplesmente não queria fazer nenhuma concessão em matéria de ritmo: iria muito devagar pra não detornar joelhos nem sentir dores no ombro.
E lá fui e fiz 70 kms solitária. Sem sofrer. Fiz Romeiros sem sofrer! Está certo que não vou contar qual foi minha velocidade média mas, pra vocês terem uma idéia, mal suei.
Dois dias depois, na terça do feriado, estava em Igaratá e resolvi fazer um longuinho de 18k. Saí, como sempre, do sítio dos meus sogros e rumei pela terra até a estrada de asfalto que liga Igaratá a Santa Isabel. Normalmente sigo em direção à Santa Isabel e, embora a paisagem circundante seja agradável a estrada não tem acostamento e vou pela contramão meio tensa, pois caminhões e "pois zés" cruzam comigo sem cuidado e sem desacelerar.

Estrada do Rio do Peixe
 Não costumo ir em direção à Igaratá porque é um trajeto muito curto, de cerca de 1,5 km, então não vale a pena. Mas nesse dia decidi ir pra lá primeiro, antes de rumar pra direção oposta. Ao chegar no portal da cidade em vez de fazer meia volta, segui em frente. Passei pela pracinha, pela rodoviária, pelo supermercado. Ou seja, cruzei a cidade inteira. Então reparei numa placa que nunca tinha visto antes: Estrada do Rio do Peixe, Igaratá Velha  6 km.  Por que não? pensei. E fui embora pela estrada. Asfalto precário e esburacado mas um entorno de colinas íngremes, pequenos sítios, flores, exemplares de araucária e, de vez em quando, uma nesguinha da represa (ou seria o tal Rio Verde?). Senti-me em Campos do Jordão. Pra completar, quase não me deparei com veículos motorizados. Mudei a trilha sonora animada e eletrônica e substitui por Norah Jones e Kevin Johansen pra combinar com o clima bucólico. Naquela toada, infiltrada naquela paisagem entrei naquele transe que só quem corre sabe como é. Um transe em que você fica completamente sintonizado com seu corpo mas, ao mesmo tempo, está integrado ao ambiente como se fosse a atmosfera que está nele e onde ele está: perfumes, cores, texturas, formas. Meu desejo era seguir por horas a fio, confundida com aquele lugar.
Sabia que não poderia correr adiante por tempo indeterminado.  Uma hora teria de voltar sob pena de me machucar. O que me consolou foi pensar que na volta, veria a mesma estrada de um ângulo diferente e também o fato de que poderei retornar ali quando for a Igaratá. Mas, na próxima, deixo o carro na cidade, de lá pego a estrada e vou até...?
Na sexta passada fui correr pelas ruas de São Paulo logo ao amanhecer. Lá pelas tantas, cheguei à entrada do Minhocão e, vejam só, ele ainda estava fechado para o tráfego. Faltavam 15 minutos para abrir. Não tive dúvida. Tive o privilégio de correr solitária pelo Elevado, enquanto a cidade despertando, se agitava logo abaixo dos meus pés e me espiava sonolenta das janelas dos prédios ao redor. Calculei o tempo exato para não ser pega de surpresa pela abertura da cancela. Imaginar-me ilhada no viaduto com os carros passando rentes a mim não era nada convidativo. Desci a rampa no instante em que o o marronzinho da CET se encaminhava para abrir o portão. Uma caravana de carros aguardava impaciente.

Treinar junto com outra pessoa é divertido. Conversamos, rimos, brincamos. Mas nos distraímos, desconectamos do nosso corpo, das nossas sensações, da percepção do que está em volta. Algumas sensações só conseguimos ter se estamos focados naquilo que estamos fazendo, se sairmos do verbal, pararmos de pensar em palavras e nos concentrarmos no sensual (relativo aos sentidos, não à sexualidade). Em nossa exclusiva companhia, na cidade adormecida, no campo desconhecido, por entre as curvas de Romeiros é possível aprender um pouco mais sobre a gente mesmo e sobre o mundo.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Pelo fim da animosidade

Impossível deixar o tema escapar. Sei que os meus fiéis leitores acessam este blog atrás de posts sobre treinos, provas etc mas, sinceramente, me sentiria ridícula em escrever sobre meu treino de hoje (o primeiro de natação depois de quase dois meses), ignorando o que acabou de acontecer.

Não, não se preocupe. Não farei campanha pra nenhum candidato. Não escondo meu voto, mas não acho que seja relevante divulgá-lo. Quero, sim, fazer um apelo ao espírito esportivo no período eleitoral. Estou muito incomodada com a falta de respeito de pessoas supostamente educadas e esclarecidas no debate político. Uns desqualificam o Serra porque ele seria carrancudo ou “limitado espiritualmente” outros acusam Dilma de “trator” e de idiota, assim como havia os que chamavam Marina de “filha de Maria” em tom de deboche. Que espécie de debate é esse? Atire a primeira pedra quem não bate na mesa de vez em quando, acorda mal humorado, fica meio abestalhado em algumas situações ou que tenha convicções espirituais, religiosas ou esotéricas . Não seria mais útil, interessante e honesto que avaliássemos e discutíssemos programas, propostas, idéias, currículo e atuação profissional?

E quando escrevo “discutir” não estou falando em bater boca. Embora pareça, política não é futebol. No futebol, não tem acordo. Nasceu corintiano, corintiano até morrer – menos o meu marido, é claro – mas isso é história pra outra ocasião. Torcida não tem racionalidade alguma. É paixão. E, a menos que ultrapasse os limites da civilidade como, infelizmente às vezes vemos acontecer, não há mal em que seja paixão. É legítimo defendermos nossa paixão clubística sem nenhum argumento decente.

Mas, com política não pode ser assim. Não podemos ser sectários e defender partidos ou pessoas apenas porque um dia em nossa vida os escolhemos e nunca mais revimos essa escolha. Não podemos defender nossa posição na base do grito, da torcida mais barulhenta, da bandeira maior – há que se ter argumentos.

Política também não é religião. Religião tem a ver principalmente com fé, crença, dogmas. Sim, há também os valores, mas é a fé o eixo central. O debate político não deveria ser uma questão de fé, nem de crença, mas de princípios. Quais são os princípios que regem os seus atos? Quais os princípios regem as suas escolhas? Não basta escolher candidatos que se aproximem mais de seus princípios – mas de ser fiel a esses princípios quando se posicionar, quando decidir compartilhar sua posição ou debate-la com alguém.

Por que é tão difícil um debate civilizado? Por que tanta animosidade? Por que ficamos irritados, raivosos, com os que não pensam como nós? Por que raramente conseguimos ouvir o que pessoas que pensam diferente de nós têm a dizer? Discordar, sobretudo, é uma arte. Assumir uma posição que não é condescendente tipo “ah, perdoai-os pai, eles não sabem o que dizem” nem agressiva “é um bando de idiotas mesmo” “chuuuupa, fulano(a)!”, ou cínica “ah, é tudo a mesma porcaria” mas, sinceramente disposta ao diálogo.

Somos uma democracia novata, mas já saímos das fraldas. A tranqüilidade com que transcorreram as últimas eleições é um feito do qual temos todos de nos orgulhar. Em poucas horas tivemos o resultado das urnas – e o volume de votos era sem precedentes— mais de 135 milhões! Ainda assim, ninguém contestou os resultados.

Mas temos muito, muito mesmo que aprender em termos de confronto de idéias, coerência de princípios, capacidade de escuta e posicionamento. Quando digo “temos” me incluo não apenas por força de expressão, mas porque também acho que preciso de um treino.

Como qualquer outra coisa que se queira fazer bem, dá trabalho. Exige autocrítica, conscientização, empenho e jogo de cintura. Bom... mas se você está planejando fazer um iron, não há de ser tão difícil assim!