domingo, 6 de março de 2011

Ilusões e sonhos

A aula de balé

Quando crianças, meninos e meninas sonham em ser bailarinas, jogadores de futebol, judocas, artistas de circo, guitarristas... E o uso do verbo “sonhar” não é mero acaso. Sonham com o palco onde vão brilhar, com o golaço que vão fazer, a faixa preta que vão vestir, os solos de guitarra que vão abafar. Sonham, iludem-se, criam fantasias. São crianças e conhecem apenas um lado dessas ocupações. O mais óbvio, aparente e sedutor. Por isso muitos pais e mães se decepcionam quando seus filhos vão animados ao primeiro treino ou primeira aula e já na segunda ou terceira querem desistir. Ao defrontar-se com sua primeira seqüência de “pliés”, a pretendente à bailarina percebe que não será tão simples e rápido conseguir dançar uma maravilhosa coreografia e encantar a platéia. O mesmo se dá com o pequeno guitarrista ao sentir que as pontas de seus dedos doem depois da simples e árdua combinação de dois acordes, que produziram um som surdo e desafinado tão distante daquele que ele imaginara tocar.
Muitos desistem. Alguns, com a firmeza e empenho dos pais, permanecem, ainda que a contragosto.
Às vezes, depois de um tempo, quando começa a ter sucesso na aprendizagem daquela arte ou esporte, a criança começa a gostar e já não é mais preciso vencer uma batalha a cada aula ou treino. Ela vai com gosto. Começa a ter prazer em executar aquela pequena seqüência de pliés com perfeição ou a surpreender-se com os acordes que já não soam mais surdos. A ilusão vai se desfazendo e o que vai se delineando em seu lugar começa a interessar.
Outras vezes, não. O menino desiste de brigar, vai à aula ou treino, cumpre tabela mas não se entusiasma. Se pudesse optar, pularia fora na primeira oportunidade.
Como mãe, penso várias coisas a respeito disso, mas não vêm ao caso.

Os adultos
Nós, adultos, conhecemos mais sobre o mundo e seu funcionamento. Sabemos que as aparências enganam que, dificilmente o sucesso vem de mão beijada e que deus ajuda quem cedo madruga.
Então, nós, adultos muitas vezes paramos de sonhar. Não nos vemos fazendo algo diferente, ousado, difícil. Por achar que nos conhecemos bem, deixamos de nos atrever, de testar nossos limites. Por outro lado, não estamos livres das ilusões. Elas ainda nos seduzem de diversas formas: na idéia de que poderíamos ter outra carreira que nos fizesse mais feliz ou uma mulher mais bonita, (ou um marido mais sensível), uma grama mais verde que a do vizinho...

Sonhando com o Ironman
O triathlon – principalmente o Ironman – desperta os sonhos dos adultos. Alguns logo pensam “não é para mim”, outros se imaginam cruzando a linha de chegada. Os primeiros, que acham que não é possível, não lembram a incrível capacidade humana de aprender, de resistir, de se superar. E os outros, não imaginam as inúmeras horas que terão de ser passadas com a bunda no selim, nos zilhões de ladrilhos contados no funda piscina, nas corridas pra longe da família e dos amigos.
Mas, tanto uns como outros, só irão compreender a essência do triathlon - e depreender algum prazer dela  -, se persistirem por algum tempo. Pode ser que rapidamente a ilusão se desfaça e alguns voltem pra sua modalidade favorita ou, ao contrário, cada passo seja encarado como uma pequena vitória, cada pequeno aumento no volume de treino como superação de um desafio e tudo isso vai, aos poucos, revelando para o novo adepto novidades a respeito dele mesmo.

Sonho realizado
Não sei quanto a vocês mas me lembro que o Iron era um sonho distante quando comecei a treinar.
Também não imaginava a dimensão que o triathlon teria na minha vida. As duas coisas foram se consolidando aos poucos e simultaneamente. Na medida em que fui me vendo capaz e gostando de aumentar o volume de horas com a bunda no selim, o número de ladrilhos contados e a quilometragem das corridas, a possibilidade de fazer o Iron foi despontando na paisagem.
E é muito curioso como tornei algo que me parecia sobre-humano, possível. Sonhar é importante, mas mais do que acreditar no sonho é necessário des-iludir-se. Ou seja, apreciar cada parte do esforço, desmontando a ilusão e transformando em real-ização.

6 comentários:

  1. Concordo com tudo o que você disse. Dos sonhos quando crianças às desilusões da vida adulta e me considero uma pessoa que não deixou de sonhar, de querer mais, de testar até onde posso ir.

    Acho que neste processo de construção do Ironman, você esteja no caminho certo quando, mesmo com a dureza física e emocional do dia-a-dia, com dias que começam ainda de noite, treinos cada vez mais longos e exaustivos, certa privação de convivência com família e amigos, você ainda continue sonhando coma linha de chegada. Esse é meu combustível dos treinos e sei que a cada treino que passa, vai ser bem mais difícil do que eu gostaria que fosse, mas ainda assim, é um sonho possível e vou fazer virar real! Aliás, vamos todos fazer...

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  2. O sonho serve para nos colocar no trilho do goal.
    Fazer o Iron é tão maluco que mesmo no fim de feito, achamos as distâncias monstras.
    Mas quando estamos apaixonados, nada é impossivel, os treinos de 5 h de bike as longas corridas de 2h 30 m, são feitas com um sorriso nos lábios.
    E no dia marcado, estamos ali para disfrutar na distância, da partilha de um sonho com outras milhares de almas, essa é a magia do Iron, depois do tiro de partida, você começa uma viagem que irá guardar para toda a sua vida.

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  3. Bem interessante essa comparação.

    Como vc disse, as crianças se iludem com os aplausos, sucesso, holofotes, flashs de fotografia, e etc...
    O Ironman não esta incluído nesse desejo das crianças, por que não aparece em nenhum lugar na mídia.

    O legal de nós adultos quando desejamos fazer o Ironman, é que não no iludimos com holofotes nem flashs, pois sabemos que não existem. É só o prazer de completar o desafio.

    Não tenho uma opinião formada ainda sobre a popularização, e massificação do Ironman. Não sei se gosto da ideia de no futuro, ver crianças olhando para a TV, e vendo um esporte como este e apenas querendo fazer parte dele, pela fama dinheiro e flashs de fotografia que viriam acontecer... exatamente como acontece com outras situações no esporte.

    Acho que é bem melhor que fiquemos de total coadjuvantes nesse lado da mídia, e que apenas pessoas que "pensam", ja adultas e maduras para encarar de cabeça o desafio de completar esse Monstro que adoramos chamado Ironman.

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  4. "apreciar cada parte do esforço, desmontando a ilusão e transformando em real-ização".

    Perfeito isso. Parabébs pelo blog! :)

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  5. Adorei. Também sei algo sobre tornar algo que parece sobre-humano possível. Coisa boa de experimentar, que vale o esforço, eu acho.

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