segunda-feira, 13 de junho de 2011

Ironman II - Sai de mim que este corpo não te pertence! - O pedal

  Então sai da água e vi meu tempo. 1 hora e 9 minutos. Não gostei. Três minutos a mais do que em 2010. “O mar estava mexido, todo mundo deve ter nadado pior” – pensei. Mas não adiantou. Não queria sair perdendo de mim mesma logo na primeira modalidade.

Apertando o "lap"
Estava congestionado na área de “arrancagem de roupa de borracha” e quase tive de pegar senha. O staff é eficiente, portanto consegui me liberar rapidinho. Voei pelo tablado afora, ultrapassando um monte de gente que passeava, recuperando o fôlego. Quase na tenda, passei o Marquinhos Pereira, colega de treino, e notei que ele estava muito pálido e parecia mancar. Perguntei se estava tudo bem e ele respondeu que sim, mas não foi muito convincente. Eu estava com pressa, não havia muito que fazer por ele mesmo e eu tinha certeza de que em questão de minutos ele me alcançaria no pedal, segui em frente.
Para minha felicidade, a sacola estava lá e os adesivos coloridos facilitaram o serviço de encontrá-la.
Sentei, vesti a meia, a camisa de ciclismo, a faixa na testa, passei Chamois nas regiões de maior contato com o selim, saí com o capacete na cabeça e os óculos na mão. Árvore e tenda, árvore e tenda, árvore e tenda, repetia pra mim mesma enquanto me dirigia ao corredor onde estava minha bike. Árvore qual? A da tenda branca! Achei fácil. Empurrei até a área de monte, achei um cantinho e deslizei o pé pra dentro da sapatilha da direita, que estava clipada e presa por um elástico. Saí pedalando no estilo “pé com pano, pé sem pano” (quem lembra???). O elástico não soltou fácil, não. Mas nem entrei em pânico. Já tinha até treinado essa situação. Esperei chegar a um lugar menos tumultuado para calçar a outra sapatilha. E esse procedimento que, confesso, tanto temi em tantas provas, foi super tranquilo. Parece bobagem, mas fiquei toda orgulhosa.

Testa franzida. Espírito do mal encarnado

Por incrível que pareça, lembrei de apertar o botãozinho de “lap” do Garmin tanto na passagem da transição do tapete ao sair da natação, quanto na hora em que saí pra pedalar. Mentalizar a prova antes ajuda a gente a não esquecer estes pequenos detalhes.
Logo na saída de Jurerê a pista estava congestionada. Muita gente saiu junto e no trechinho inicial a estrada é estreita, estão estava difícil não embolar. Até aí, eu estava recuperando a calma e entrando no espírito ciclístico. Na hora em que entrei na SC 401, começou o inferno 2.

Bad trip. “Tem algo estranho com minha pedalada. Vou ter dor. Estou sentindo o joelho. A minha virilha está esquisita. Nunca usei essa roda 1080, isso não pode dar certo. Não fui bem na natação, vai ser muito pior no pedal. Porque diabos eu inventei de fazer outro Ironman mesmo???”. E por aí afora. Vinte quilômetros de auto sabotagem.

Assim como veio, o espírito do mal que me encarnou, foi embora e comecei a me sentir muito, mas muito bem. Não ventava, o pedal encaixou, minha média estava cada vez melhor, o sol brilhava – ah, não passei protetor depois de sair da água – os passarinhos cantavam, o dia estava lindo. “Que bobagem... É CLARO que vou fazer um tempo melhor! Estou bem mais treinada! Vai dar tudo certo!”
Passei a Juju, avistei a Nilma que estava à minha frente, ultrapassei um atleta que lotou seu capacete gota com adesivos da família, conversei rapidinho com um e outro atleta. No retorno, há poucos quilômetros do fim da primeira volta, percebi que o vento estava aumentando.
No retorno, a passagem pelo trecho “Paris-Roubaix”, com todos aqueles paralelepípedos e pessoas aclamando, a gente fica animado. Logo de cara, onde começa a avenida que termina no retorno, estava o Wagner, meu técnico, que queria, a um só tempo, saber como eu estava e me incentivar a ir com tudo e não perder tempo com acenos e beijinhos. kkkkk. Mas é LÓGICO que não obedeci.
Na hora que a gente passa pela principal aglomeração, tem um locutor que vai anunciando quem passa. Quando passei, ele estava anunciando o cara da minha frente e eu logo gritei “E TAMBÉM A CLAUDIA, 729! É A CLAUDIAAAAA! APLAUSOS PRA ELA!!!” levantei braço (e não oS braçoS, porque naqueles paralelepípedos nem o Lance Armstrong se atreve), o locutor deu risada, me aclamou,a galera aplaudiu, saí rindo e com a energia – supostamente – renovada.


Sorriso. Espírito do mal desencarnado
 
E no início da segunda volta, ao contrário da primeira, nas subidas, eu já ultrapassava mais atletas do que era ultrapassada.
Chegando ao centro, o vento começou a pegar. E o terceiro inferno começou a pegar. O espírito do mal reencarnou em mim novamente. “Que m... estou fazendo aqui? Nunca vou melhorar meu tempo com esse vento. Vai ser uma frustração. Tanto treino, bicicleta nova, pra nada! Nada! Só este sofrimento, só essas dores? Para quê? Alguém pode me explicar pra quê isso tudo? Investir todo esse tempo, esse dinheiro? Não faz sentido. Nunca mais vou fazer essa merda. Chega.”
Como este trecho é vai e volta e vai e volta e vai,  e assim também o espírito do mal vai e volta, porque, obviamente que há momentos em que o vento esta a favor. Nessas horas o espírito do mal se afastava um pouco.
Lá pelas tantas, num trecho em que o vento era lateral, uma rajada quase me derrubou. Juro mesmo. Nunca tinha passado por algo assim. Culpa da 1080. Que susto. Dali em diante só deitei no clipe quando tinha certeza de que o vento não era lateral. Eu, hein.
No meio da volta, o Marquinhos Pereira me alcançou. “Nossa,” pensei “só agora?” Então ele me contou que tinha sido jogado pra pedras ao final da natação e que tinha se machucado. Estava explicado.
Na volta, embora o cansaço fosse maior, o vento ajudava e, assim, o espírito do mal foi sendo soprado pra longe. Soquei a bota. Não olhei a velocidade –porque a essas alturas o imã do cateye tinha escorregado e não funcionava, — mas fiz força. Ultrapassei muita gente. Na subida, na descida, no plano. Na descida bati meu recorde de velocidade: 59,9 km/h (vi isso depois no registro do Garmin). Nunca tinha feito isso na vida. Foi bom. No trechinho final – que a gente passa a saída pra Jurerê, aproveitei o vento a favor e, na volta, a leve descida. Na estradinha pra Daniela, em empolguei. Sentia-me como um cavalo quando percebe que está voltando pra cocheira. Alcancei o Marquinhos. “Sou eu que estou bem ou você que está mal?” Ele, gentil, respondeu que eu estava bem. Era um pouco de cada coisa.

"Tudo bem!"
 Chegando a Jurerê, passo pela Dani e Karla, esposas do Wagner e do Kaká, que perguntam como estou, respondo com um sinal: positivo.
Solto as sapatilhas e já vou, mentalmente, visualizando tudo que farei no momento em que desmontar da bike. Desço, aperto o “lap” só que esqueço de olhar meu tempo final e minha média. Não sei se fiz como queria, mas tenho certeza de que fui melhor do que em 2010.

3 comentários:

  1. Sempre pensei que treinar a "cabeça" é tão necessário qto o físico....

    Parabéns!!!!

    Bjs
    Lu

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  2. Claudia,
    mais uma vez parabéns pelo excelente resultado e pela vitória sobre o "espírito do mal"...
    Abraço.
    Jorge Monteiro

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  3. Pô esse relato em doses homeopáticas tá de matar! Não dá pra mostrar as cenas dos próximos capítulos de uma vez? kkk

    Essa história de espírito do mal me fez lembrar dos Thundercats! huahua Denunciei minha idade e minha falta do que fazer aos domingos!

    Agora, que velocidade é essa? 59,9km/h. Tá honesta demais... Se arredondasse pra 60km/h duvido que a KPMG ia aparecer pra auditar o Garmin. Mas de qq forma, eu acho que ia ficar com medo de pedalar nesta velocidade. Vamos ver este Domingo no Duathlon. Rola uma ponte com um gradiente de inclinação razoável.

    Aguardamos ansiosamente a corrida. Espero que não tenha esfregado shampoo na viseira/boné.

    Inté,
    Shigueo

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