quarta-feira, 9 de junho de 2010

Iron 2010, diário de uma insanidade ou 11 horas 35 minutos e 17 segundos que levaram quase um ano pra acontecer

Parte 7 (partes 1 a 6, abaixo)

Desta vez, mesmo sem cérebro, achei minha sacola amarela. Já pensou se a sacola tivesse sumido nessa hora? Eu iria duvidar da minha capacidade de discernimento meeesmo. Mas ela estava lá, com tudo que eu tinha deixado nela.
De novo joguei tudo em cima das cadeiras e, novamente, duas queridas me ajudaram na operação. O mais difícil, eu sabia, seria colocar as minhas super meias injinji. Mas até nisso eu havia pensado antes (ainda bem, porque naquela hora, pensar não ia prestar). Primeiro, passei um pouco de vaselina no pé, depois enfiei as meias até encostarem os dedos das meias, nos dedos dos pés e pedi pras minhas ajudantes colocarem dedinho por dedinho.
Foi um luxo. Me senti na pedicure. Cada uma colocou a meia em um pé e, portanto, em cinco dedos e, enquanto isso, eu tirava a camisa de ciclismo, pegava uma goiabinha, os géis e colocava nos bolsos da bermuda e do top, vestia o cinto de hidratação, a viseira, largava o óculos. Meias devidamente colocadas, calcei os tênis, apertei a roldana (é uma roldaninha mesmo), pedi o pote de vaselina e elas ajudaram a me lambuzar inteira com ele. Quase esqueci de colocar as garrafinhas com accelerade, que devia ter deixado no cinto antes, e quase esqueci de colocar o Garmin no pulso.
Nesse ínterim, reencontrei minhas pernas. O cérebro, não. Mas tinha alguns neurônios avulsos, que caíram na hora que tirei o capacete e ficaram por ali mesmo.
Com esses poucos neurônio consegui encontrar a saída E acionar o Garmin. Incrível!

Corrida
Começar a corrida, no meu caso, era terminar a prova. Não sei se era excesso de confiança ou se era puro autoconhecimento mas tinha certeza de que, em tendo começado a correr, cruzaria aquele pórtico antes das 17 horas regulamentares.
Logo após a saída, encontrei a Julinha que foi, por fora da pista, atropelando a platéia e me acompanhando.  Quando passei pelo MPR e pelo Emerson, eles gritaram "Calma! Calma! Diminui esse ritmo ou você não vai aguentar!". Olhei pro Garmin: 4m49s por km. É, realmente... era melhor desacelerar um pouco. Puxei o freio e fui com a Juju até a primeira entrada à direita, onde nos separamos.
A primeira volta tem 21 km e passa por duas subidas entre os kms 8-10 e depois volta por essas mesmas subidas, entre os 15 e 17.
Encaixei um ritmo firme entre 5m20s, 5m30 por km, até chegar na subida. Ela é íngreme, mas é curta. Decidi não andar mas continuar num trotinho bem miúdo. Fui que fui, passando uns e outros que caminhavam. No meio da ladeira, vi um branquelo sair rapidinho pra esquerda, onde tinha um matinho e umas pedras e, na maior sem cerimônia, abaixar as calças e agachar! Eca. Virei pro outro lado, mas não pude deixar de escutar os sons característicos de quem está no vaso solitário.
No alto da subida, tinha uma torcida festiva. Uma mulher me olhou bem e gritou "Eu te vi na TV! Eu te vi na TV!" Dei risada e respondi "era eu mesma, a maluca que tem quatro filhos!" e ela puxou uma salva de palmas pra mim.
A subida foi mais fácil do que eu imaginara. Chegando no plano, só alegria. Comecei a brincar com o pessoal dos pontos de apoio. Eles ficavam enfileirados, cada um com sua oferta "Água! Água" ou "Gatorade! Gatorade!" e ainda "Pepsi! Pepsi!" e eu passava perguntando a cada um "Vodca? Vodca?". No começo eles ficavam confusos (não sei porque, já que não tinham pedalado e os cérebros deles não tinham ido parar no capacete) mas depois também brincavam "Xii! Não tem! Só mais tarde!" E eu continuava a brincadeira "Mas que droga de bar! Nem uma vodca!"
Por volta do km 13, tive uma surpresa. A família toda estava ali, junto com mais uns outros malucos, fazendo a maior festa pra todos os atletas que passavam. Passei dando uma beijoca suada na bochecha de cada filhote e eles me acompanharam correndo por algum tempo. Na volta, idem! Aproveitei pra deixar meu cinto de hidratação com eles e avisar, mais uma vez pra os pequenos que correram um trechinho comigo "Eu estou bem! Fala pra vovó e pro vovô que eu estou muito bem!". Imaginava que poderiam estar preocupados, e quis tranquilizá-los.
Subidinhas de novo, descida e pronto!
Era só manter o ritmo.
O cérebro não fez muita falta. Entrei num transe, deixando a cabeça vazia.
Antes de terminar a primeira volta, alcancei a Nilma! Fiquei feliz, porque ela estava beeem na minha frente. Mas cheguei disse "Demorou, mas te alcancei" e ela respondeu "Aê! Você tá bem! Vai, vai em frente!" E eu fui mesmo.
Terminei a primeira volta e a passagem pela avenida dos Búzios, onde fica a maior parte do pessoal que está assistindo, é a hora mais gostosa. Você caras conhecidas vibrando, gritando seu nome, gente que você conhece pouco, mas que, naquela hora, age como se você fosse a pessoa mais importante do mundo e mesmo os desconhecidos, que torcem, parabenizam e aplaudem porque, afinal, você está participando de um IRONMAN!
Fiquei muito mas muito feliz, quando vi o Roi, meu marido, gritando pra mim, vibrando, totalmente tomado de entusiasmo. Aquilo me encheu o coração e os pulmões!
Saí pra segunda volta com mais pique ainda.
No km 23 tinha a parada estratégica do special needs. Fui clamando pela Gra, que logo achei. Eu iria colocar uma camiseta de manga comprida, pegar o accelerade e mais um advil. Ela perguntou se eu iria trocar de tênis ou de meia mas não! Eu tinha ZERO desconforto nos pés. Vesti a camiseta. Olhei, achei que estava de trás pra frente porque não tinha etiqueta. Tirei, vesti de novo. Aí realmente estava de trás pra frente. Tirei e vesti pela terceira vez, convencida de que não teria outro lado pra vestir. O cérebro me fez um pouquinho de falta nessa hora!
O sol começou a baixar e vestir mangas compridas foi uma boa. Nesta volta passei por uma menina muito forte da minha categoria. mas ela já tinha as duas pulseiras. Estava fechando a 3ª e última volta. Bom... pensei, lá se vai o 2º lugar. Imaginava que a Valéria estava na frente dela e que ela seria a segunda colocada. mas não fiquei chateada, não. Estava curtindo a prova.
Passei bastante gente. Muita gente andava. Muita gente estava caindo aos pedaços. Eu estava no mesmo ritmo.
Numa esquina sombria, na avenida dos Dourados, passei pelo Diglu, que perguntou "E aí? Você tá se divertindo?" respondi "Muuuuuiiiito!" e toquei em frente.
Fechei a segunda volta ouvindo o berro do MPR "Claudia! Você tá correndo muitoooo!" , o Emo, meu técnico "Claaaau, você é demaissss!" e o Roi  "Clau, ce tá voandooo!". Com tantas levantadas de bola, fui ficando cada vez mais convencida.Convencida de que eu tinha de terminar sub 4.
E agora faltava apenas a derradeira.


3 comentários:

  1. Corrida é a nossa praia Clau, é só colocar o tênis, neurônio pra quê? Só atrapalha, tira energia preciosa das pernas...kkkk! E pessoal, ela foi boazinha dizendo "passei bastante gente", ela deu tapa na bun(beep) de muito marmanjo! Aêeee!

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  2. Isso está sendo a melhor série de posts de aventura que li nos últimos tempos! :-)

    Abraços!
    Rodrigo Stulzer
    transpirando.com

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