Estava fissurada para treinar. Hoje era dia de treino cruzado (20 km bike/4km corrida/ 20km bike/ 4km corrida 20km bike/ 4km corrida) é longo, fatigante mas muito dinâmico: não dá tempo nem de enjoar, você desce da bike e começa a correr, em 20 minutinhos ou menos, termina a corrida e aí bike de novo. Quando se viu, foram 3 horas de treino e você nem sabe como o tempo passou. Adoro. E, em 2009, por conta das minhas lesões não tinha feito ainda. A expectativa era grande.
Saímos num grande pelotão. E isso seria apenas na primeira perna de 20 km da bike porque, depois disso, eu e os outros que fariam o cruzado, sairíamos pra correr. O Emerson pediu “os mais experientes na frente, sinalizando os buracos, mantendo o ritmo e organizando o pelotão”. Embora ele tenha me elegido entre a lista de mais experientes não me considero tão experiente assim e evito ficar à frente quando o pelotão é muito grande.
Durante os primeiros 15 km tive de dar uns berros, pedindo que as pessoas da frente avisassem sobre os buracos, pois já havia caído em alguns por falta desses avisos. Pra quem não sabe, pelotão funciona num efeito dominó — para o bem ou para o mal — se os primeiros avisam e ninguém rompe o elo da cadeia, os últimos ficam informados dos perigos: buracos, pedestres na contramão, obstáculos, ciclistas mais lentos a serem ultrapassados. Se não avisam ou se alguém rompe a transmissão da informação: danou-se! As conseqüências podem ser desastrosas.
E foi o que aconteceu. Fechando a última volta de 5 km, na raia, logo após a entrada do remo, lá estava ela: a cratera. O primeiro não avisou, o segundo se assustou mas, sem tempo de avisar, apenas se desviou, o terceiro quase caiu, o quarto, caiu na lateral e perdeu a garrafa d’água e o quinto caiu em cheio. Quem era o quinto? Eu.
Por sorte (e um pouco de habilidade também) não cai da bike. A 36 km/h o tombo teria feito um estrago. Parei na mesma hora para avaliar os estragos. Gra foi a primeira a parar pra ver como eu estava. O pneu da frente estava cheio. Segui um pouco mais e fiz o retorno para encontrar o pelotão. Mas o pneu de trás murchou. Parei e comecei a praguejar. “Que raiva! Que ódio! Ninguém avisa! Que droga! Vai acabar com meu treino cruzado!”
O pelotão fez o retorno no fim da raia e, Claudio, Rodrigo e Cachorrão (não confundam com Cachorro Louco) pararam pra ver o que tinha acontecido. Imediatamente, Rodrigo começou a tirar a roda traseira, Cachorrão a buscar seu kit de troca e o Claudio ficou de auxiliar. Rodrigo tirou rapidamente a câmara estourada e colocou uma oferecida pelo Cachorrão. Peguei minha cápsula de CO2. Não funcionou. Tentamos a do Cachorrão. Também não deu. Felizmente, Rodrigo também tinha uma. Conseguiu encher. Neste ínterim, Marcos e Marcos (que já estavam fazendo a primeira perna de corrida do cruzado), Rubão e Jun, chegaram. A válvula da câmara estava com defeito, o pneu estava esvaziando.
O pelotão passou e mais três pararam: Gusmão e dois novatos cujos nomes não me lembro. Eu ia começar a reclamar de novo do meu azar, de justo no dia que vou fazer o cruzado, isso me acontece e bla bla bla, quando o Claudio virou-se para mim e disse baixinho: “olha como você é querida. Todo mundo parou pra ver como você estava e te ajudar”. A reclamação murchou imediatamente na minha boca. Lá estava eu, com uma roda torta, um pneu furado e um exército de homens à minha volta, dispostos a me ajudar. E, como não podia deixar de ser, Claudio completou, em voz alta: “Se fosse eu, vocês iam passar e ainda tirar uma da minha cara ‘aê, Claudião,se vira tatu!’”
Depois disso, meu humor mudou. Tivemos uma cena de pastelão, pois conseguimos mais cápsula de CO2 e como o bico estava vazando, os meninos me instruíram: “monta na bike, clipa o pé na sapatilha. Vamos encher o seu pneu e você zarpa, pra dar tempo de você chegar até o fim da raia antes de esvaziar”. Fiquei a postos. Um disse “vai”, o outro disse “não!” e eu, que segui o primeiro comando, fui. Direto pro chão! Meu pé tava preso na sapatilha, tentei dar a primeira pedalada, mas como tinha um segurando a roda, só fiz desequilibrar e cair. Felizmente, não foi nada sério. Só engraçado.
Não dava pra ir com o pneu daquele jeito. Era preciso, novamente, trocar a câmara. E recomeçou todo o processo. Mas ninguém tinha CO2. Então eu e a Gra começamos a pedir para os ciclistas que passavam “tem bomba? Tem bomba?” Em 5 segundos, parou um gentil sabichão que tinha uma bomba manual e também muitos conhecimentos sobre troca de pneus – pois começou a dar uma aula pros meninos, que começaram a se irritar. O processo foi rápido. Ainda bem. Por que eu estava vendo a hora que o Rodrigo e o Claudio iam enfiar a bomba na boca do cara e inflá-lo até que ele saísse voando por aí.
Consegui chegar à área de transição. Mas percebi que a roda dianteira estava bem avariada.
Deixei a bike, contei para o Emerson o que tinha acontecido e fui correr com o Claudio, que gentilmente me esperou.
Quando estava saindo, o Gusmão, ciclista experiente que acabou de chegar da “Etape Du Tour”, comentou: “Que prestígio, hein Claudia?! Desmontou o pelotão!”.
Marcos me emprestou a roda dele, corri melhor do que esperava. Fiz o cruzado que eu tanto queria.
É bem possível que a roda não tenha conserto. Em compensação, se não fosse esse infortúnio, talvez eu nunca tivesse me dado conta do lugar que ocupo nesse pelotão.
Muito bom esse texto!! Bem observado o fato de muitos terem ido te ajudar, mostra realmente o quanto você é querida. E é uma situação ideal para lembrarmos que todos merecem isso, que podemos interromper nosso treino para ajudar alguém que esteja precisando! bjs
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