sábado, 15 de agosto de 2009

Penha, em 2008 - 1ª parte

Quando fui para o 70.3 de Penha, já tinha nas costas um ano e meio de participações em provas de triathlon – shorts, na maioria, e alguns olímpicos. Não tinha mais medo de errar na transição, nem de atrapalhar ninguém. Acreditava que seria capaz de terminar a prova, mas não sabia em que condições.Logo que me inscrevi, Emerson, meu técnico, disse: “Vamos pegar a vaga pra Clearwater, hein!”. Eu sabia vagamente do que ele estava falando. Não dei muita bola. O 70.3 de Clearwater é o campeonato mundial que acontece no final do ano, na Florida, para o qual só podem se inscrever os atletas qualificados em uma das 20 e tantas provas de 70.3 que acontecem ao longo do ano pelo mundo afora. Cada prova coloca em jogo certo número de vagas. Essas vagas são distribuídas pelas categorias (faixas etárias de 5 em 5 anos) em quantidades proporcionais aos números de inscritos.Quando a prova foi se aproximando, ele voltou no assunto: “Não se esquece de levar os dólares. Nós vamos pegar esta vaga!”. Parênteses para explicar: algumas horas depois da prova as pessoas qualificadas são chamadas para fazer sua pré-inscrição no mundial e, para isso, precisam ter o dinheiro em espécie. Espécie verde. Dólares.Não tinha muitas esperanças de levar a vaga. Minha categoria teria apenas duas e a primeira já era da Viveka – de quem perdi todas as vezes em que competimos. A segunda, me disseram, seria muito difícil também pois havia duas candidatas fortíssimas. Mas, pelo sim, pelo não, comprei os tais dólares.Fui para Penha sozinha. Nem marido, nem filhos, nem pais. E, apesar de sentir a falta deles na hora da torcida, foi bom. Pude me concentrar totalmente na prova. Passear na feirinha com calma, cumprir todos os rituais pré-prova sem ter de dar explicações para ninguém.Eu estava livre, leve e solta e convivi com diferentes pessoas (que conhecia apenas de vista) e me diverti. Sai do aeroporto rachando um taxi com o Thiago, almocei com a Paulinha, Gabriel e Pedro, jantei com Beto, Juliana, Gra, Junior e Leandro, peguei carona com o Armandinho pra ir pra transição, tomei café com o Nickolas e o Douglas, voltei da prova com o Nando e assim por diante. Também inventei um jantar na véspera da prova que organizei junto com a Gra ainda em São Paulo. Foi um sucesso. O lugar era muito agradável, a comida (feita por encomenda) estava gostosa, todos os atletas da MPR foram e acabou sendo uma confraternização. Foi tão legal que este ano estou repetindo a dose.Na noite anterior à prova, quando encostei a cabeça no travesseiro antes de dormir ,passei mentalmente todas as etapas e, principalmente, as transições. Nesta mentalização, esqueci de pegar os óculos escuros ao sair para pedalar. Adivinha? Na prova, esqueci deles mesmo!O dia amanheceu resplandecente. Uma surpresa para quem tinha, no dia anterior, comprado roupas de frio para pedalar, pois o tempo estava tenebroso: frio e garoento.Empurrei um café da manhã goela abaixo – não tenho fome às 5 e meia! Alguém tem? Sim! O Nickolas, meu colega de espelunca olímpica, bateu um pratão de macarrão àquela hora. Assisti incrédula. Fiquei também observado o que a Mariana Ohata iria comer, mas a mãe dela foi logo avisando – iiiihh ela só come tranqueira! Melhor você não imitá-la.O clima de uma prova dessas é totalmente diferente do que eu estava acostumada. Tem assim uns ares internacionais, sabe? Você não sente, quando está num aeroporto, como se estivesse numa terra familiar, mas, ao mesmo tempo, um pouco estrangeira? É assim.Depois de fazer o “body marking” – escrever o número do peito nos braços, pernas e as letras da sua categoria nas pernas, a gente vai cuidar dos detalhes: abastecer a bicicleta (que foi entregue no dia anterior) com comes e bebes, encher os pneus, ver não esqueceu de nada, tirar a roupa civil e vestir a de borracha, ficar com dor de barriga e vontade de fazer xixi... essas coisas.Na praia, o sol despontava num céu inacreditavelmente azul. Alguns entraram na água para sentir a temperatura, dar uma soltada nos braços e encaixar melhor a roupa de borracha. Não eu. Pra que sofrer duas vezes com água fria? Entro só depois da buzina. Nessa hora a gente conversa, mas não sabe nem o que está dizendo. Os olhos também não param em canto nenhum. Pequenos gestos: subir o zíper da roupa de borracha, ajeitar a toca, limpar os óculos, preparar cronômetro, engolir um gel. Abraços, preces, preocupações.Toca a buzina. Sai a boiada. Seiscentas pessoas ao mesmo tempo, indo pra mesma bóia. É uma guerra. Pancadaria. Ainda bem que eu tinha me preparado pra isso: “vou levar, mas também vou dar”. Cotovelada – braçada –tapa – braçada – encontrão - braçada – empurrão -braçada. Lá pelas tantas alguém segura as minhas pernas e joga pro lado! No contorno da primeira bóia o compasso é cotovelada empurrão chute – braçada – tapa cotovelada encontrão – braçada. Não me importo. Não sofro. Faz parte do jogo. Ninguém está bravo ou ofendido. Não é pessoal. Saio da água em 35 minutos. Melhor do que esperava. Quase não encontro minha sacola no meio de tantas outras iguais. Corro pra tenda da transição. Tiro a roupa de borracha com ajuda, passou a chamois butter pra não ficar assada, coloco os manguitos porque tinha medo do frio, sapatilha, capacete bike. Esqueço os óculos. A saída bike era numa subida de paralelepípedos. Pode?! Levei as sapatilhas na mão, passei a linha de monte, vesti as sapatilhas com calma e saí, ladeira acima. Durante o pedal me alimentei bem, me hidratei sem parar e mais do que as pernas, usei a cabeça. Mantive um ritmo confortável. Eram cinco voltas de 18 km. Conheci a Nilma , conversei com um ou outro atleta mais simpático e menos competitivo. Isso de ter o nome da gente no número de peito (no caso, costas) é muito legal. Me diverti. Curti a prova. A Kiki, que estava assistindo a prova, comentou comigo depois que não se conformava de ver que eu estava sorrindo o tempo todo.

Um comentário:

  1. Claúdia ! ...Essa foi também minha primeira prova de 70.3 ! Realmente inesquecível !!! e quando conto que te conheci em pleno trajeto da bike...ninguém acredita !!! pois como pode duas pessoas conversarem e fazer força no pedal ao mesmo tempo...!? que bom que conseguimos essa façanha!

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